29 outubro 2003

Retoma Brasil!



Este texto era para a minha coluna no Sobrecarga, mas um colega falou sobre o mesmo tema e achei que não tinha a ver repetir o assunto. Então fica aqui...



"Desde o advento do furacão Collor e do renascimento com o “Carlota Joaquina”, o cinema brasileiro vem ensaiando o seu “retorno triunfal”, que acabava sempre freado por ziquiziras econômicas e montanhas russas cambiais.

Nessa tal “retomada do cinema brasileiro” parecia sempre estar faltando alguma coisa. Muitos dizem que era o público (maldade...)

A verdade é que o cinema brasileiro até vinha acertando um ou outro filme (o próprio Carlota, depois “O Quatrilho”, “Central do Brasil”, “Cidade de Deus” etc), que levava rios de gente ao cinema. Mas faltava sempre aquela constância, aqueles filmes de sucesso (e orçamento) medianos, que mantém o mercado vivo e chutando.

Sem esse elemento que faltava (o público constante), o cinema brasileiro nunca teve a menor chance diante da máquina da indústria (e do comércio) de Hollywood. Os filmes brazucas amargavam exibições de meia a uma semana, de meia a uma sala por vez. E tchau! O cinema brasileiro ganhava uma piscadinha nas telonas e o resto da vida na prateleira poeirenta das locadoras ou exibições esporádicas no canal Brasil ou nos festivais, dentro e fora da TV.

Mas de repente, algo mudou.

A Rede Globo, a nossa Hollywood tropical, resolveu finalmente sair da cozinha e botar seu pezinho nas salas de cinema. O resultado? Um fenômeno de público atrás do outro. Tá certo que muitos deles eram requentados e até meio esquisitos tecnicamente. Mas há algo muito interessante acontecendo. Algo que eu não vejo desde que eu era moleque e tinha filas quilométricas no cinema para ver “Dona Flor e Seus Dois Maridos” (ah, isso foi no tempo em que a Sônia Braga ainda não era lésbica, mas sim a “Dama do Lotação”).

Na semana passada, uma olhada na programação de um multiplexo genérico de 18 salas era de se espantar. Afinal, 7 das 18 salas exibiam filmes nacionais. Tudo bem, um deles era o “Maria, o filme do padre”, mas mesmo esse tem seu valor, pois o “cinema carola” acaba levando pras salas gente que nunca foi ou vai ao cinema. È público novo para o cinema.



Mas é nos filmes como “Os Normais” que pode estar a fórmula de uma transição segura para um cinema brasileiro viável comercialmente e ainda assim interessante estilisticamente.

A adaptação do sitcom de Fernanda Young e Alexandre Machado para as telonas, por incrível que pareça, funciona até melhor do que na TV. O filme é uma mistura em doses quase perfeitas daquele jeitão esculhambado do humor nacional com as comédias românticas americanas que a Meg Ryan adora(va) fazer.

“Os Normais” acaba sendo uma versão bem brasileira de um cinemão bastante popular entre os jovens das grandes cidades, mas que fala também com aquele grande público que não lê legendas, não vê TV a cabo e acaba sendo, isso sim, o verdadeiro público brasileiro que precisa ser levado aos cinemas.

Olha que elogiar a Fernanda Young é sempre um “conflito interior”, mas a moça saia-justa, mesmo com toda a sua “atitude” meio mala-pesada, deu uma bola dentro. Como escritora modernosa e celebridade profissional, ela se revela uma excelente roteirista (basta ver “Bossa Nova”, outro bom roteiro dela que rendeu um filme meio morninho) para ver que ela sabe misturar muito bem as fórmulas hollywoodianas com um “jeitinho brasileiro” de se fazer TV e cinema, na tradição das chanchadas, do humorismo televisivo e das novelas. Pode ser que esteja aí a saída.

Queiramos ou não, a TV faz parte da nossa cultura, e um cinema que se pretenda genuinamente brasileiro, pode sim se apoiar na telinha para formar o público das telonas do futuro.

Se Hollywood deixar, claro..."

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